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Notícias da Fenafisco

Um grande defensor do aluno juiz

24 de outubro de 2011


Relativamente recentes no
país, as Escolas Judiciais Trabalhistas propõem um novo ingrediente
à “formula” da judicatura: estimular os magistrados a não
largarem os livros, mesmo após aprovação nos disputados concursos
públicos. Entre os estudiosos, o conceito ganha o nome de “aluno
juiz” e pretende aumentar a qualidade dos serviços ofertados à
população. O objetivo é mostrar que nunca se passa da fase de
aprender. Simples assim. As escolas judiciais pertencem aos tribunais
do Trabalho. São 24 ao todo. Na prática, essas unidades apontam
caminhos para a capacitação dos magistrados, definem competências
e implementam a formação. “Precisamos perceber que assim como
muda o mundo, a Justiça precisa mudar no mesmo passo”, comenta
Giovanni Olsson, juiz assessor da Direção da Escola Nacional de
Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat). A
instituição foi criada em 2006. Nesta entrevista, o magistrado fala
sobre o novo modelo de pensar a Justiça, analisa o processo de
formação dos juízes do trabalho, aponta os “gargalos” dos
concursos e comenta a Resolução 126 do Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), sobre a qualificação do Judiciário. Para ele, o “cidadão
quer alguém que entenda o seu problema”.

Por que o
senhor defende o conceito de “aluno juiz”?

A
questão do juiz como eterno aprendiz é um aspecto fundamental para
a qualificação profissional. Neste processo de mudança da
sociedade, ele precisa ser um aluno juiz. Isto é: alguém que está
aprendendo cotidianamente, não só pessoalmente (acréscimos à sua
experiência de vida, de emoções), mas também profissionalmente,
porque o Judiciário lida com problemas deste tempo. O aluno juiz
precisa identificar os problemas e, ao mesmo tempo, encontrar
soluções mais eficientes para todas as questões. O aluno juiz é
um aprendiz constante. O aluno juiz é muito especial porque, por
prerrogativa e garantia da cidadania, tem a liberdade plena para
ouvir e dizer: discordo disso. Os meses iniciais da carreira devem
definir o que o profissional vai se tornar na primeira década. As
escolas judiciais são importantes porque é nelas que se aprende a
ser juiz e se desenvolvem as bases dessa formação.

E
as competências?

A formação é dentro da
profissão, com base na profissão e para a profissão. A competência
profissional é aquilo que o juiz faz de concreto. O processo é “na
profissão” porque estamos “aprendendo a dirigir” com o
“caminhão andando”, sentados ao volante. Somos “alunos
juízes”, estamos aprendendo. O processo também é “para a
profissão”, porque a ideia tem que repercutir no trabalho. Os
juízes vão para a escola para que a jurisdição seja melhor: o
nível de conciliação aumente; a execução se torne mais célere,
mais positiva; para que o juiz se relacione melhor com toda a
sociedade. A formação é institucional, feita pelos próprios
tribunais. Não comporta a terceirização. As palavras não são
gratuitas.

Qual a maior lição de tudo isso?

Certa
vez, no último dia de aula, um aluno me disse: “Achei, no início,
que, depois de aprovação em um concurso dificílimo, e de ter feito
pós-graduação, parecia meio indigno ser chamado de aluno juiz na
escola. Agora, após viver tudo isso na Enamat, vi que estava errado
e que não posso parar de aprender. A verdade é que se deixasse de
ser aluno, eu é que não seria digno de ser chamado de juiz”.

Como
o senhor avalia a resolução 126 do CNJ?

De maneira
geral, ela trata da qualificação do Poder Judiciário e tem um
aspecto importante à medida que traz o debate para dentro do CNJ.
Mas suscita outros problemas porque acaba interferindo nas escolas já
existentes. É uma resolução que tem controvérsias sobre até que
ponto deveria valer ou se poderia ser editada desta forma. De todo
modo, o debate que ela lança é sobre o reconhecimento da
importância do tema. Jamais se chegaria a pensar numa resolução se
o tema não fosse importante. Isso mostra que a questão da
qualificação dos juízes é o assunto do momento. O juiz é o
agente central do processo judiciário. Não haverá um Judiciário
melhor, se o juiz não for melhor. E as escolas são espaços onde os
magistrados e os serviços podem ser qualificados.

A
seleção por meio de concurso é suficiente para escolher os futuros
juízes?

O concurso para ingresso na magistratura é
complexo. Possui cinco fases e se estende por um ano. Mas,
normalmente, avalia muito mais o conhecimento teórico na área do
direito. Envolve habilidades como expressões escrita e oral. Porém,
acima de tudo, é um concurso de provas teóricas, em que se mede,
muitas vezes, a memória do candidato, sob certos dispositivos. E
isso não é suficiente para que o candidato, quando chegue ao final
e seja aprovado, tenha condições de, efetivamente, resolver os
problemas dos cidadãos. O que as pessoas querem, quando chegam à
Justiça, nos seus variados ramos, é que o conflito seja resolvido.
Para tal, o juiz precisa conhecer o direito, sim, mas também ter
noções de economia, psicologia, administração, gestão de
pessoas, técnicas de entrevista. O concurso é apenas o início. É
seletivo, rígido, mas não tem condições, por si só, de
identificar e desenvolver tudo aquilo que o candidato precisa para
ser bom juiz.

Por que o mito da autossuficiência
técnica torna-se um problema?

É inegável que o
concurso da magistratura é um dos mais difíceis, em todas as
profissões, em todas as áreas, no mundo inteiro. Mas a seleção
não basta, porque a dinâmica da sociedade e a complexidade dos
problemas exigem cada vez mais dos profissionais. Para o cidadão, o
seu problema é o mais importante do mundo, ou seja, só ele sabe a
dor e a angústia causada pelo obstáculo. Também existem aspectos
psicológicos, sociais, econômicos. O conflito que chega ao
Judiciário através de uma pessoa é de todos. E a magistratura
precisa solucionar o problema

O processo eletrônico
elevou o número de atividades dos juízes?

O
processo eletrônico não é apenas fazer, no computador, o que se
faz em papel. É uma mudança radical, uma reinvenção do modelo de
prestação de serviço. Também não é processo digitalizado, o
processo em PDF. É uma nova cultura, um novo paradigma. A Justiça
brasileira está sendo recriada. Se isso vai ser melhor ou pior, é
outra discussão. Mas acredito que ele tem condições de ser mais
preciso.

Hoje, a tendência é analisar o conflito em
uma perspectiva “macro”?

A nova visão propõe
que o conflito é multidimensional. Estamos habituados, pela formação
jurídica mundial, a perceber apenas “uma cor das coisas”. Mas
para o cidadão, usuário do sistema de justiça, a dimensão
jurídica é um fragmento do todo. O conflito é complexo.  Por
trás do papel, do processo, existe um ser humano que tem um
conflito. Ele não está procurando uma manifestação jurídica
formal, mas sim a solução para o problema. A nova visão significa
que, reconhecendo o problema como uma questão complexa, o entrave
precisa ser tratado na maior dimensão possível. É a heurística:
juntar os pedaços do todo. O cidadão não quer saber qual é,
apenas, o fundamento jurídico que diz que ele ganhou. Ele quer saber
se ganhou ou perdeu, o motivo da decisão, e se vai receber algum
valor. O cidadão quer alguém que entenda o conflito como o problema
é para ele. Para o cidadão, jurisdição é direito de acesso, ou
seja, “chegar lá”, e com eficiência, celeridade, educação e
cortesia. Resolver o processo não é suficiente.

Por
que o sistema não consegue oferecer essa “fórmula’’?

Por
duas características próprias. Uma ligada ao modelo de recrutamento
(graduação em direito, três anos de prática e capacidade
mnemônica) e outra relacionada à carreira. Para o magistrado novo,
ela é perversa, porque dele se espera tudo. Ele tudo pode já no
primeiro dia. Nós não temos no sistema brasileiro aquisição
progressiva de competência. Isto é, o nosso juiz substituto, com um
dia de exercício, pode se deparar com questões da maior
complexidade, como ações civis públicas (envolvem interesses de
milhares de pessoas e demandas psicológicas). Coisas que não são
ensinadas nos cursos de direito e, muito menos, avaliadas neste
modelo de recrutamento. Esse é o grande desafio da nossa realidade.
O “novo juiz” não está preparado para isso, seja porque ninguém
o ensinou nas academias ou porque o concurso não tem capacidade e
pretensão de avaliar isso. Então, precisamos de outro agente, que é
a escola. Passar no concurso é apenas o início. A seleção é
“moleza” perto do que vem depois.

Saiba mais

A
Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do
Trabalho (Enamat) foi instituída pelo Tribunal Superior do Trabalho
(TST), como órgão autônomo, em 1º de junho de 2006. Sua fundação
atende à Emenda Constitucional 45/2004.A Enamat é a primeira escola
do país destinada a regulamentar os cursos para ingresso e promoção
na carreira de juiz

Atualmente, é dirigida pelos ministros
Aloysio Corrêa da Veiga e Horácio Raymundo de Senna Pires. É
assessorada por um conselho consultivo composto por ministros do TST,
juízes dos TRTs e varas do Trabalho. O objetivo é promover a
seleção, a formação e a qualificação dos magistrados do
trabalho.De acordo com a Enamat, a atualização contínua do juiz é
necessária

A escola promove cursos de formação inicial
(dirigidos a juízes do trabalho substitutos recém-empossados),
formação continuada (sob a forma de colóquios jurídicos e
seminários, presenciais ou a distância, dirigidos aos magistrados
de qualquer grau e em exercício) e capacitação de formadores (para
juízes-formadores das escolas regionais de magistratura no Brasil)

Fonte: Diário de Pernambuco

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